Algumas explicações de termos utilizados na luta contra o racismo
Ação Afirmativa: Políticas de ação afirmativa têm como objetivo corrigir os efeitos presentes da discriminação praticada no passado, concretizando o ideal de efetiva igualdade de acesso a bens fundamentais como educação e emprego.
Ações afirmativas são um conjunto de políticas públicas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário concebidas com vistas à promoção de populações historicamente discriminadas e ao combate à discriminação. Cotas são só uma delas. Outras são: incentivos fiscais para quem emprega negros, por exemplo.
“As políticas de ação afirmativa – não apenas relacionadas a negros e mestiços, mas a quaisquer outros segmentos – buscam corrigir distorções para, a partir daí, promover a igualdade. Não apenas na área educacional, mas econômica, trabalhista, empresarial. Devem ser incansavelmente debatidas, mas nunca descartadas, sob pena de o país jamais se livrar do selo da desigualdade que o retém no Terceiro Mundo.” (colunista Flávia Oliveira; GLOBO 23/02/03)
“Toda a publicidade do Executivo federal deverá contemplar a diversidade racial brasileira, sempre que houver o uso de imagens de pessoas. Os casos excepcionais deverão ser justificados, com base em critérios técnicos.” (ofício-circular distribuído pela Secretaria de Comunicação de Governo da Presidência da República; OESP 25/02/03)
Apartheid – Foi um dos regimes de discriminação mais cruéis de que se tem notícia no mundo. A palavra quer dizer separação na língua africâner, de um setor de sul-africanos descendentes de europeus. O sistema de apartheid atingia a habitação, o emprego, a educação e os serviços públicos e vigorou na África do Sul de 1948 até 1990. A Constituição sul-africana da época tirou a cidadania da maioria negra, dando aos negros “passaportes” para transitar dentro do próprio país. Supostamente, eram cidadãos de “países independentes” no interior pobre do país. Além disso, os negros não podiam ser proprietários de terras, não tinham direito de participação na política e nas cidades eram obrigados a viver em zonas residenciais separadas dos brancos, como o eram, também, os mestiços. Os casamentos e relações sexuais entre pessoas de grupos raciais diferentes eram ilegais.
Branquitude – Ser branco é um ideal estético, segundo Guerreiro Ramos. Muniz Sodré afirma que a civilização européia é uma espécie de “modelo identitário das elites nacionais.” Para Kabengelê Munanga, a cor não é uma questão biológica, mas uma das “categorias cognitivas herdadas da história da colonização, apesar da nossa percepção da diferença situar-se no campo do visível.”
Na prática, ser branco exige pele clara, feições européias, cabelo liso; ser branco no Brasil é uma função social e implica desempenhar um papel que carrega em si uma certa autoridade ou respeito automático, permitindo trânsito, eliminando barreiras. Ser branco não exclui “ter sangue negro” ou indígena.
Cotas – “Quanto à confusão entre cotas e ação afirmativa, o professor José Murilo de Carvalho escreveu com propriedade: ‘Cota é apenas uma forma de ação afirmativa (...). Ação afirmativa é toda política voltada para a correção de desigualdades sociais geradas ao longo do processo histórico de cada sociedade. Baseia-se na convicção de que a justiça social exige que a igualdade não seja apenas legal e formal (...)’.” (editorial Jornal do Brasil; JB 23/03/03)
Direitos Humanos – Princípios universais interdependentes e indivisíveis que obrigam os Estados a proteger, respeitar, promover e garantir direitos no âmbito político, civil, econômico, social e cultural.
Discriminação – Diz respeito a toda distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo, gênero, raça, cor da pele, linhagem, origem nacional ou étnica, orientação sexual, condição social, religião, idade, deficiência etc., que tenha por objeto ou por resultado anular ou depreciar o reconhecimento, gozo ou exercício em condições de igualdade entre todas e todos aos direitos humanos e liberdades fundamentais em qualquer das esferas, incluindo a pública, privada, política, econômica, cultural ou civil.
Discriminação Racial – A Convenção Internacional para a Eliminação de todas as Normas de Discriminação Racial da ONU, em seu artigo primeiro diz que a discriminação social “significa qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada na raça, cor, ascendência, origem étnica ou nacional com a finalidade ou o efeito de impedir ou dificultar o reconhecimento e/ou exercício, em bases de igualdade, aos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou qualquer outra área da vida pública." (Convenção ratificada pelo Brasil em 27 de março de 1968).
Diversidade – Em 2001, a Conferência Geral da UNESCO aprovou, por unanimidade, a Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural. Fala do reconhecimento das diferenças como necessário à realização dos direitos humanos e liberdades fundamentais, para a paz e a segurança e define a diversidade cultural como patrimônio comum da humanidade:
“A cultura adquire formas diversas através do tempo e do espaço. Essa diversidade se manifesta na originalidade e na pluralidade de identidades que caracterizam os grupos e as sociedades que compõem a humanidade. Fonte de intercâmbios, de inovação e de criatividade, a diversidade cultural é, para o gênero humano, tão necessária como a diversidade biológica para a natureza. Nesse sentido, constitui o patrimônio comum da humanidade e deve ser reconhecida e consolidada em beneficio das gerações presentes e futuras.” (Artigo 1).
Essa é a posição comum de todos os governos que participam da UNESCO. A diversidade se constrói a partir de diferenças. Para que se efetive o potencial da diversidade, é preciso dar valor à diferença. Ou seja, o conceito de diversidade apresenta os mesmos problemas que o de mestiçagem (ver mais abaixo): se a gente não reconhece os elementos constitutivos como diferentes, a diversidade se reduz a “panos quentes” que se aplicam em situações de conflito. Para resolver o conflito racial brasileiro, com suas dimensões econômicas, sociais e políticas, é preciso reconhecer as diferenças antes de chegar a nosso patrimônio cultural comum; esse patrimônio não é só uma valorização abstrata da diversidade, mas a luta pela justiça social.
Eqüidade – Configura um princípio de justiça redistributiva, proporcional, que se pauta mais pelas necessidades de pessoas e coletivos e por um senso reparador de dívidas, do que pela sua igualdade formal diante da lei. Representa o aprofundamento do princípio de igualdade formal de todos diante da lei. Ele implica que pessoas e coletivos que se encontram em circunstâncias especiais ou que são diferentes sejam tratados de forma especial ou diferente.
Estereótipo – Um estereótipo é um conjunto de traços que supostamente caracterizam um grupo, deformando sua imagem da mesma maneira que quando se faz uma caricatura, com todos os perigos de distorção e empobrecimento da percepção social.
Gênero – O vocábulo "gênero" começou a ser utilizado no Brasil entre as décadas de 1980 e 1990, em decorrência do impacto político do feminismo, para marcar que as diferenças entre homens e mulheres não são apenas de ordem física, biológica.
Gênero busca explicar as relações sociais entre homens e mulheres. Esse conceito foi utilizado como categoria de análise primeiramente pela antropologia, que coloca o "ser mulher" ou "ser homem" como uma construção social. A palavra gênero, tirada da gramática, foi utilizada para identificar essa construção, diferenciando-a do sexo biológico.
Podemos afirmar que a categoria gênero – a despeito de suas distintas utilizações – tem viabilizado um maior reconhecimento do ideário feminista, assim como das desigualdades estruturais que afetam distintamente homens e mulheres, contribuindo para inscrever, no campo das políticas públicas, a pertinência do tema e da utilização do termo.
Interseccionalidade – “O termo 'interseccionalidade' se refere às articulações entre a discriminação de gênero, a homofobia, o racismo e a exploração de classe. (Maylei Blackwell e Nadine Naber - Revista de Estudos Feministas, Vol.10, No.1, jan.2002).
Meritocracia – Um sistema em que se avança a partir de capacidade e realizações; uma elite composta de realizadores talentosos; a liderança exercida por tal elite.
“A meritocracia faz parte do ideário liberal puro, que incentiva a livre competição a partir da idéia de que todos são iguais perante a lei, portanto, todos teriam as mesmas condições para competir. Quem sempre teve privilégios por causa da cor da pele (branca) que mérito tem em ocupar sempre os lugares de destaque?” ( Neide Fonseca, advogada, é presidenta do INSPIR-Instituto Sindical Interamericano pela Igualdade Racial; artigo na edição de maio/2002 da revista Eparre).
Mestiçagem – Quando se fala de mestiçagem, é importante não fazer qualquer concessão à ideologia da mistura como antídoto ao racismo. A identificação do Brasil como país mestiço foi, no início do século XX, uma resposta da auto-estima brasileira à ideologia do embranquecimento, foi uma inovação emancipatória no discurso de identidade nacional. Mas a história da mestiçagem como característica nacional vem de antes. No Brasil Colônia, mestiços eram valorizados porque eram considerados mais adaptados ao trabalho nos trópicos e porque teriam meio caminho andado entre o mal do negro e o bem do branco. A mestiçagem, historicamente, foi engendrada pela violência e a dominação, assim como pela resposta que os dominados deram. Mas a tendência hoje é de aderir à mistura racial como qualidade atemporal, enquanto o branco continua ocupando posições de prestígio e poder.
“O elogio à mestiçagem e a crítica ao conceito de raça vêm se prestando historicamente para nublar a percepção social sobre as práticas racialmente discriminatórias na nossa sociedade.” (Sueli Carneiro, coordenadora executiva do Geledés)
Mulato – O dicionário Houaiss nos dá uma sexta acepção: “aquele que é filho de pai branco e de mãe preta (ou vice-versa)”. O primeiro verbete de “mulato” é “mesmo que ‘jumento’”. Não é por acaso, portanto, que muitas pessoas mais conscientes dos efeitos do racismo não querem ser denominados “mulatos”. Experimente com as conotações da palavra “mulata”, para sentir o desprezo embutido na palavra.
Duas formas fundamentais de discriminação cruzam a sociedade, todas as relações sociais no Brasil: o racismo e o sexismo. Gênero e raça são eixos estruturantes dos padrões de desigualdade e exclusão social no Brasil. É impossível eliminar esses padrões de desigualdade e exclusão sem enfrentar – ao mesmo tempo – as desigualdades e a discriminação de gênero e raça.
Políticas universalistas – O princípio da universalidade refere-se à responsabilidade dos governos de assegurarem a todas as pessoas, sem distinção de qualquer tipo, o acesso aos serviços públicos e aos direitos sociais: saúde e educação pública e gratuita, todos os direitos da previdência e da assistência social.
“A defesa intransigente das políticas universalistas no Brasil guarda, por identidade de propósitos, parentesco com o mito da democracia racial. Ambas realizam a façanha de cobrir com um manto ''democrático e igualitário'' processos de exclusão racial e social que perpetuam privilégios. Postergam igualmente o enfrentamento das desigualdades que conformam a pobreza e a exclusão social”. (Sueli Carneiro - Correio Braziliense –30/04/2003)
Preconceito – Como seu nome indica, é um pré-conceito uma opinião que se emite antecipadamente, sem contar com informação suficiente para poder emitir um verdadeiro julgamento, fundamentado e raciocinado. Ao contrário do que se possa pensar, são opiniões individuais. Em geral, nascem da repetição irrefletida de pré-julgamentos que já ouvimos antes mais de uma vez. (Ver também Estereótipo.)
Racismo – Crença segundo a qual as capacidades humanas são determinadas pela raça ou grupo étnico, muitas vezes expressa na forma de uma afirmação de superioridade de uma raça ou grupo sobre os outros. Pode manifestar-se como discriminação, violência ou abuso verbal.
domingo, 27 de janeiro de 2008
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